segunda-feira, setembro 19, 2005

SERTÃO DE ESPINHO E DE FLOR - CANTO 7

Marcus Ottoni


Se para votar projetos de interesses duvidosos de governabilidade se fez o que gerou tudo isso, imagine o que está sendo feito para salvar-se o governo e umas dezenas de parlamentares num parlamento já comprometido pela suspeição quase que generalizada.
Eduardo Alexandre


Otoniel Menezes

"SERTÃO DE ESPINHO E DE FLOR"

OTONIEL MENEZES
2A. EDIÇÃO ANOTADA e revista por Laélio Ferreira
No prelo

Canto 7

No Piso do Comboio

“...As lendas arrepiadoras do caipora travesso e maldoso, atravessando célere, montado em caititu arisco, as chapadas, desertas, nas noites misteriosas de luares claros; os sacis diabólicos, de barrete vermelho à cabeça, assaltando o viandante retardatário, nas noites aziagas das sextas-feiras, de parceria com lubisomens e burras-sem-cabeça notívagos: todos os malassombramentos, todas as tentações do maldito...” (“Os Sertões”, pág. 139)


Sertão dos meus dez janeiros!
Cavalos mansos, baixeiros (01).
Que delícia, era viajar,
Armando a rede nos ganchos
Do alpendre aberto dos ranchos (02),
- seis dias, para chegar...

Fazer uma madrugada (03)!
A tropa, inda estremunhada,
Trota, no barro da chã...
Vai-se andando...vai-se andando...
Rósea, a barra vem quebrando (04)...
Chora, no vale, a acauã.

(“Rompe-nuvem”, baio lindo!
Viaja-se, mesmo dormindo,
No teu dorso embalador!
Teu nome – de avanço e luta –
É uma hipérbole matuta,
Chalaça de cantador!

Assim, tardo, é que te quero,
Rompe-nuvem! Que inda espero
Volver, tão dócil te sei,
- e, só por matar saudades! –
às serras, às soledades
do sertão que sempre amei!).

A ária, dulcíssima, erparze-a
Nas carnaúbas da várzea,
Graúna, avatar de Orfeu[1]!
Tua asa é a tinta do poema
Dos cabelos de Iracema,
- que, de saudades, morreu...

Latada! Mata esta sede
De madornar numa rede
Bem alvinha, de algodão!
Pelego (05), na areia...areia
Que o rio enxaguou na cheia,
- mais fofa do que um colchão...

Moça da saia encarnada,
Que eu vi, na volta da estrada,
Arisca, a olhar para mim,
- talvez nunca mais te veja!
- ou, um dia te leve à igreja,
a ouvir-te o risonho sim...

Não, nunca mais! Bem m’o disse,
Na sua sábia crendice,
Meu arrieiro (06), o Tundéu:
- Quem carcúla, se atrapáia...
De casamento e mortaia,
O corte é feito no céu!

Eu, condo (07) (fui do seu tope (08),
Quebrava (09) no curilope (10),
No lenço do gurgurão,
Tive tomem uma cera (11)
C’uma cabrocha linheira (12),
Lustrosa (l3) que só o cão (14) !

Hoje, nem dou mais nutiça:
Fizero machaviliça (15),
Briguemo. Foi fusuê (16)!
Uma sujeita zanoia,
Dixe que eu sou vira-fôia (17),
E ela num quis mais me vê...

- Diz os fio da Caindinha
Que ela, agora, é bonequinha
Do cabaré do Iguatú.
Nun vê guaiába passada (18)?
P’ru fora, cheira e é rosada,
- dento, só tem tapurú...

Pricurei meu padim Ciço.
Ele tornou-me: Feitiço
De mulata, é bem capaz
De atentá o própe Cristo;
Vá rezar, se esqueça disto,
- muié, o vento é quem traz...

Andei mascando a liamba (19),
Dei birrada (20), acabei samba,
Bebo foi meu naturá.
Sarou. Mas, p’ru dento, é vivo,
O diale do remativo (21)
Desse estrepe de juá...

Iguá o freguês sem rumo,
Que entra no mato sem fumo,
P’ra caçá, e fica é só,
Toma ferrão de tubiba (Nota?),
- e a caipora, p’ru riba (22),
inda lhe infinca o cipó...

O freguês só tem sossego,
Si num arruma chamego (23),
Mucuím (24), tixe (25) ou muié.
Rabo de saia e mundiça (26),
Faz inté faze toliça
Cavalo de carroçé (27)!

-------

Sobe a névoa matutina.
Terno, o galo-de-campina
Fere a canção do arrebol.
Desperta a fazenda, em baixo.
O dendezeiro do riacho
Apara a esgrima do sol...

Papa-arroz (28)...De nome, é feio;
Qual, porém, mais belo, veio
Da Amazônia, ou do Japão?
Tão retinto, que azuleja:
Da gorja ao peito, flameja
Um crachá cor de malvão!

A Cidade ainda distante...
Eu, o lírico estudante,
Venho em férias. Olho ao sul:

Que alvoroço, que alegria!

- a igreja da freguesia
recorta a torre no azul...

Aí vai, cruzando o caminho,
Um serrano no burrinho
Lerdo, mancando de um pé.
Entra no mato. Mas, onde,
Em que cafundó (29) se esconde
Seu ninho de caboré (30)?

Centelha, vivente, réstia
De sol, gorjeando! Tiveste-a,
A voz, no Céu, a afinar?
Pintassilgo! És o violino
De um gênio, cujo destino
É o de morrer...de cantar!

Casaca-de-couro (31). O ninho,
Enorme, é todo de espinho.
Dá-lhe o nome, a cor que tem.
Canto, em dueto: alarido!
- grita, frocudo, o marido!
- A mulher grita, também!

Sem uma folha, uma, única,
No adamascado da túnica,
O flamboiant faz lembrar
Os Doze-Pares de França[2]:
- é Roldão[3], ferido à lança,
de pé, com o peito a sangrar...

Ganhou Burbank[4] ouro e glória,
Obrigando a palmatória
A sem espinho nascer.
A nossa, não passa disto:
- nem a coroa de Cristo
tanto espinho era de ter!

Lavandeira (32), lavandisca,
Bem casadinha! Petisca,
Desde o pátio, ao corredor,
A lenda a protege e nimba:
- na água e no anil da cacimba,
leva p’ra Nosso Senhor.

Mulungú, pau de tabuado,
Num açude, és um achado
No cavalete (33) que dás!
Florido, a contar de agosto,
Na tua fronde, o sol posto
O fogo em retalhos faz...


Notas ao canto 7

01) Baixeiro: Hábil no baixo, modalidade miúda e macia, da marcha do cavalo ou do burro, muito cômoda e agradável para quem viaja. Em escala de velocidade ascendente, assim se classifica, no sertão, a marcha da montaria:

- passo
- chouto
- baixo (ou carrego)
- galope-em-cima-da-mão
- galope alto (ou largo)
- contra-marcha
- meio
- esquipe
- carreira

02) Rancho: Ou arrancho. Pouso, lugar onde se descansava, durante o pino do sol (pingo-do-sol), ou onde se pernoitava, nas extenuantes, mas tão divertidas, tão pitorescas jornadas através do sertão, prolongadas por três, quatro ou cinco dias, na marcha ordinária dos comboios, marcha que consistia em dois períodos: pela madrugada, até as 10, às 11 horas, e das 14, ou 15, às 18, em etapas de 5, 6 léguas. Havendo luar, a segunda etapa se prolongava às 19, às 20 horas. Os ranchos eram o rústico alpendre, colmado de folhas de coqueiros ou ramas de oiticica, da habitação à margem da estrada, a cuja porta a integral, encantadora hospitalidade sertaneja proverbialmente desobrigava do clássico – “ó de casa!”. Comumente, também, se não era inverno, servia de pousada, para o pernoite, alguma copada de oiticica, uma quixabeira alvinha de flor, um espetacular joazeiro em cuja copa rotunda a gente pressentia o frêmito dos canários estremunhados, sobre o clarão da pequena coivara onde ia ferver, na marmita de folha de flandres, a água para o café – o café mais gostoso, mais tonificante, mais perfumado desse mundo, e cujo pó grosso e rescendente se fazia assentar da panela.

Durava cinco a seis dias, o trajeto entre jardim do Seridó (cilangana,mergulhando-se nesta um tição com a brasa bem viva...desde que, mais de perto, interessa o poema ????) e Macaíba, ponto terminal da jornada, e de onde, através do rio Jundiaí, em lancha ou bote, se atingia Natal.

Anexins e Ditados: “Agrado é que demora viagem” * “Hóspede em casa é dia-santo”.

03) Fazer u’a madrugada: Sair do rancho, em prosseguimento da caminhada, às 3, às 4 horas e, mais cedo. O mesmo que fazer u’a mineira, no Sul.

04) A barra vem quebrando: Vir amanhecendo. Alusão às nuvens que, ordinariamente, se acastelam ao nascente, na antemanhã. Ao quebrar da barra, cedinho, de manhãzinha.

05) Pelego: Idílio. Tem quase sempre sentido pejorativo e, nesta acepção, não figura no “Pequeno Dicionário” aqui já muitas vezes citado. Vejam-se, adiante, cera (n.) e chamego (n.)

06) Arrieiro: Pajem, pessoa que se encarregava de preparar as refeições, de cuidar dos animais, durante a jornada. Almocreve, comboeiro, tangerino, cargueiro.

07) Condo: Quando.

08) Tope: Talhe, tamanho, estatura.

09) Quebrar: Usar, por luxo. Fulano só quebra no brim branco; Fulano só quebra na seda.

10) Curilópe: “Chlorilopolis do Japão”, marca de perfume popularíssimo no Seridó, há trinta anos. Era vendido em vidrinhos de 5 a 8 gramas, com etiqueta dourada – uma gueixa sobre a sombrinha de bambu e seda – a 50 centavos.

11) Cera: Namoro, idílio platônico. Veja-se adiante, chamego (n.).

12) Linheira: Esbelta, delgada, lazarina (veja-se no Canto 11, anotação (n.) à ultima palavra).

13) Lustrosa: Que não é bonita, nem feia. Simpática, bonitota. G. Barroso e M. Bandeira não colhem o termo com este significado, clássico em todo o Nordeste (Referimo-nos sempre, nestas Notas, à 2a. edição do excelente “Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa”).

14) Cão: O diabo. Veja-se Nota à palavra droga, no Canto 4, 16.

15) Machaviliça: Maquiavelice, intriga.

16) Fusuê: Barulho, disputa, confusão, arrelia. Vide verbete angu, em Notas ao Canto 11, número

17) Vira-folha: Infiel, volúvel.

18) Passada: Madura em excesso, meio podre (relativo a fruta).

19) Andei mascando a liamba: Alusão ao ciclo da cachimbagem dessa erva, que é o cânhamo, cannabis sativa, diamba, riamba, pango, maconha (a denominação mais popular, esta última). Rica, interessantíssima, a sinonímia inclui, ainda, aliamba, dirijo, birra, fumo-de-Angola, atchi (corrutela de haxixe)[5]. É uma variedade de cânhamo europeu, originário da Índia, (cannabis indica).

Esta planta, cujo uso e contrabando tanto preocuparam a policia carioca, e foi assunto rendoso a muitos jornais sensacionalistas da capital da República, é conhecida, há muitos anos, no sertão, embora o fato não tivesse sido registrado, até agora, na crônica policial ou judiciária do Estado[6]. No Seridó propriamente dito, e talvez em todo o sertão norte riograndense, não se sabe do uso da diamba.

Entretanto, o Dr. Manoel P. Diniz[7], bacharel em direito, advogado, poeta incluído na coletânea de Laudelino Freire[8], “Sonetos Brasileiros”, e que, em 1941, encontramos nas funções de secretário da Prefeitura da terra de Padre Cícero[9], escreve o seguinte, no seu curiosíssimo livro, “Mistérios do Joazeiro”, que Câmara Cascudo considera (em “Vaqueiros e Cantadores”) um dos mais importantes, minuciosos documentários do ciclo folclórico dominado pela singular personalidade daquele malogrado Barjesus[10] caririense:

“Não inventamos bichos de sete cabeças, quando nos referimos ao uso da liamba (...) Infelizmente, os nossos governos do Norte e Nordeste (onde há os mais perigosos centros de cultura e uso da liamba) ainda não criaram serviço especial de policia preventiva, contra entorpecente tão perigoso, que concorre, não só, para achinesar um povo, como para africanizar, que é muito pior. No Rio de Janeiro existe a legendária favela e, no sertão nordestino, que está mais próximo do Maranhão?” (Simões Fonseca[11], no “Dicionário Enciclopédico, afirma que a liamba é nativa daquele Estado)[12].

M. Diniz continua, - “Há muitas favelas, ou elementos de favelas, atuando particularmente nos grandes centros onde predomina a maioria da ignorância, como desgraçadamente aconteceu em Joazeiro, que só de há poucos anos a esta parte (1935) começou a sair do caos, como se fosse um novo orbe de que o padre Cícero seria o Padre-Eterno, conforme a crença de muitos romeiros que a estas horas, podem estar na Bem-Aventurança celeste, formando a imensa legião dos pobres de espírito que constituíram o maior troféu com que o Patriarca se apresentou diante de Deus, ao ser julgado (...) Mas, dir-nos-iam, que tem isto com aquilo? Muitíssimo; pois muitas pessoas, mesmo das menos simplícias, pensavam que certos tipos, particularmente pretos ou bem trigueiros, eram realmente doidos ou malucos, conduzidos, furiosos, à presença do Patriarca, para curá-los. Nem por sonho. Tais indivíduos, que vimos mais de uma vez à porta do Patriarca, contidos por seus condutores, cavilosos ou não, no dia seguinte estavam bons, e proclamando que tinham sido curados por milagres da benção do Padim Ciço. Quase todos esses tipos eram liambados, e nada mais (...) E a liamba, para a formação desses pseudo-loucos? Existia e existe em Joazeiro, embora usada ocultamente, não por medo da policia, mas porque não queriam que o Padim soubesse; não porque o amassem mas porque temiam que ele mandasse castigar os empreiteiros da cultura da liamba e do seu uso maléfico. Damos testemunho de tal erva aqui. Vimos há anos, no quintal de uma casa, à rua da Conceição, desta cidade, alguns pés de um arbusto parecido com o mastruço e de sementes semelhantes às do coentro. Eram pés de liamba”.(“Mistérios do Joazeiro, M. Diniz, tipografia do “O Joazeiro”, Ceará, 1935).

Em 1947, a revista “O Cruzeiro”, do Rio, publicou sensacional reportagem em torno do uso da maconha (liamba). Americo Valério e Gonçalves Fernandes (pesquisar), de Pernambuco, têm publicado estudos especiais a respeito.

20) Birrada: Pancada (de birro, bilro, cacete curto), caçambada, tamburetada, sabacuzada, lapada, gebada (esta última tem também sentido obsceno).

21) Remativo: Reumatismo. Qualquer dor surda e intermitente, cuja causa não conheçam, é assim denominada, entre os matutos.

22) E a caipora, p’ru riba: O sertanejo acredita na caipora[13], duende, espírito protetor dos animais silvestres, espécie de saci-pererê, um negrinho muito vivaz, de barrete vermelho, sempre cavalgando um porco ou um veado, e cuja presença se manifesta num assobio agudíssimo e prolongado. Exige, dos caçadores, o tributo de um pedaço de fumo, sem o que não poderiam eles penetrar impunemente no mato, ou realizar caçada compensadora. O castigo mais temido é o de uma sova de cipó, quando a caipora topa com um devedor relapso, reincidente. Aos caçadores mais felizes, atribui-se estarem em dia com o imposto.

23) Chamego: Namoro, em sentido pejorativo. Agarrado, pergamasso, pelego, arranhado, xodó, chichinado (subst). Animação, cera, influência e ponta são empregados na acepção platônica. Por ocasião de sua última viagem ao Seridó (1941), já ouviu o Autor dessas Notas, em “rodas”de cafés e bilhares, chafrandrilha, chumbregação, e fiapo (tirar fiapo com fulano, ou fulana), termos da gíria plebéia natalense. Há, ainda, aqui (Santo Deus!), mamparra, fraguido, ronçoio (do verbo roçar?), etc.

24) Macuim: Ou micuim, espécie de carrapato microscópico, habitante das folhas verdes, e cuja picada produz inaturável comichão.

25) Tixe: Piolho das aves domésticas, goniodes stylifer. Cafife, mundiça. No feminino, cafifa, significa importunação, estribilho irritante, mofina, caninga, infuca, amolação (veja-se caninga, nas Notas do Canto 6, 05).

26) Mundiça: Imundície. Denominação dada, entre o povo, a qualquer praga de parasitas, especialmente de galináceos e colombinos (mundiça). Gente ruim, canalha, cambada. Em sentido afetivo, trata também assim o matuto a própria família:

- Como lhe vai, a obrigação?

- A mundiça tá viva, graças a Deus....

Jaques Raimundo[14] (“O Elemento afro-negro na Língua Portuguesa”, pg. 124) ensina que mundiça é sinônimo de grande quantidade (Mato-Grosso), e cita uma frase de Taunay[15], em “Inocência”, pg. 101: “Trouxeram de lá uma imundície de gente amarrada”.

Pode ser, esta, a significação em que o matuto emprega a palavra, referindo-se à prole, ordinariamente numerosa entre os casais sertanejos.

27) Cavalo de Carrosel: Sujeito que não sai dos limites, em questões de despesa; econômico, a mais não poder, somítico, avareto; pirão-na-unha, amarrado-de-corda, pão-duro, dura-fogo.

28) Papa-arroz: Pássaro da família das Fringiloidas, Dolychonix oryzivorus. Xexéu de coqueiro, de plumagem negro-azeviche, ou azul-forrete, encontradiço nos coqueirais e carnaubais. Anda sempre em bandos, nos quais avultam as fêmeas. O macho, ave belíssima, quando adulto, tem a plumagem ainda mais escura, e uma faixa cor de brasa viva no papo, começando da parte inferior do bico.

29) Cafundó: Lugar deserto e longínquo, de difícil acesso; furna de serra.

30) Caboré: Glaucidium brazilianum, Gm., pequenina coruja pintalgada, não apenas noturna, e que só nos ermos serranos comumente constrói o ninho, nos buracos da velhas árvores e barrancas. Quando canta, nas proximidades do inverno, é mau sinal. Cuidam os matutos ouvir, no melancólico regougo, em tom grave do caboré, repetida sinistramente, a onomatopéia ameaçadora: sol...sol...sol...

31) Casaca-de-Couro: Ave do sertão e da caatinga, da família das Mimidas, e também chamada Maria-cocoruta, denominação que lhe vem da poupa de penas. Na várzea do Açu, é também conhecida por catapirra. É toda de cor de couro, curtido recentemente. Anda aos casais, tanto no mato como nas árvores dos quintais urbanos, onde todos os anos faz o ninho – um ninho enorme, tão entretecido toscamente de gravetos espinhosos, mas forrados, no interior, com pluma de algodão e capins delicados. São tão grandes, estes rústicos gineceus, que, não poucas vezes, arreia com o peso deles o galho da jurema, de favela ou de “turco”, que os suportava. Há árvores com cinco, seis e mais, ninhos de casaca-de-couro, sempre construído pelo mesmo casal – anos e anos. A casaca tem dois terríveis inimigos, o punaré[16] e o concliz. O primeiro, um ardiloso e voraz rato silvestre, para lhe devorar os filhotes; o concliz, (vide esta palavra no Canto 6 ? procurar), para expulsá-la, aproveitando-se velhacamente da “casa” pronta, para chocar a própria ninhada. A casaca só canta em dueto, um canto alto, agudíssimo, estridente, alegre, caprichoso, sem melodia consagrada pelos Hercules Florense e pelos Gonzaga-Duque do pentagrama avícola do deserto, mas cheio de graça agreste e de saudosa ressonância, ouvido a grande longitude na solidão comburida dos meios-dias sertanejos. Frente a frente, junto ao ninho, e pulando vivo e miúdo, os topetes riçados, as asas distendidas e peneirando, “marido” e “mulher” se desafiam, ardentemente, nesta estrídula melopéia que, a breves intervalos, martelam o dia inteiro.

32) Lavandeira: Lavandisca, Fluvícola climazura. Esclarece Câmara Cascudo, em “Aves no Folclore Brasileiro”, cit.:

“Vão ter uma surpresa, quando lhes disser que a lavandeira está no Index, também. Apesar de seus hábitos simples, de sua familiaridade, de suas visitas às calçadas e cozinhas, de seus saltos e reviravoltas, a lavandeira não é boa peça. Se lavou a roupa de Nosso Senhor, é que foi obrigada, ou quis agradar uma vez na sua vida. Dá azar, e dos grandes. Para anular seu inconveniente prestígio maléfico, quando lhe derem de comer, especialmente carne verde, não lhe dêem de beber. E vice-versa”.

33) Cavalete: Toro de madeira leve – especialmente, o mulungú -, muito usado, nos açudes e nos rios, como precioso auxiliar dos exercícios de natação. É o salva-vidas clássico no sertão.

[1] Figura mitológica, filho da musa Calíope, músico e poeta, marido apaixonado de Eurídice. Quando tocava sua lira, os pássaros paravam de voar para escutar e os animais selvagens perdiam o medo. Ele ganhou a lira de Apolo; alguns dizem que Apolo era seu pai.

[2]“Carlos Magno e os Doze Pares de França”, canção de gesta, narrativa com muitas batalhas que se espalhou por todo o sertão e inspirou violeiros e cantadores. A tradição é que esses pares, cavaleiros que formavam uma espécie de tropa de elite do imperador Carlos Magno, eram doze e assim se fixa o seu número no primeiro poema que celebrou a batalha de Roncesvalles — La chanson de Roland.

[3] Forma abrasileirada de Roland, um dos Doze Pares de França, personagem principal da canção carolígea – acima referida -, do ano 1070, sobre a emboscada sofrida pelo Rei franco Carlos Magno, no desfiladeiro de Roncesvales, em 778, pelos bascos

[4] Luther Burbank, (1849-1926), pioneiro dos alimentos ditos hoje transgênicos um dos maiores gênios de melhoria de plantas. Vivia na Califórnia no início do século e que criou centenas de variedades. Livre-pensador, darwinista.

[5] Outras denominações da maconha....

[6] Desenvolver o assunto, fazendo comparações no tempo/epaço....

[7] Natural da Paraíba. Atuou no inventário do Padre Cícero.

[8] Laudelino de Oliveira Freire (Lagarto-SE, 26/01/1873 – Rio de Janeiro-RJ, 18/06/1937), advogado, jornalista, professor, político, crítico e filólogo, nasceu em Lagarto, SE, em 26 de janeiro de 1873, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 18 de junho de 1937. Foi da ABL.

[9] Cícero Romão Batista (Crato-CE, 24/03/1844 – Juazeiro do Norte-CE, 20/07/1934), o Padre Cícero do Juazeiro, “Padim Ciço”. Político importante, “Coronel” de muito prestígio, fazendeiro milionário, fez revolução contra o governo da República. Fundador da chamada “Meca nordestina” (Juazeiro do Norte).

[10] Pesquisar

[11] Pesquisar

[12] Pesquisar cannabis maranhensis

[13] Pesquisar nome indígena

[14] Pesquisar

[15]

[16] Pesquisar

por Alma do Beco | 11:22 PM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

.. .. ..

.. .. ..

Recentes


.. .. ..

Praieira
(Serenata do Pescador)


veja a letra aqui

.. .. ..

A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

layout by
mariza lourenço

.. .. ..

Powered by Blogger

eXTReMe Tracker