quinta-feira, fevereiro 03, 2005

Ao operário intelectual Luciano de Almeida

João Gualberto Aguiar

Foto: Lenilton Lima

Luciano de Almeida, da Cooperativa dos Jornalistas de Natal, vem da militância revolucionária clandestina dos anos 70. Mandei para ele um punhado de versos livres, quando estava preso na Ilha de Itamaracá. Esqueço o poema que ele rasgou depois de ler e mostrar aos companheiros de cárcere.
Conheci Luciano no Atheneu Norte-Rio-Grandense, no período anterior e posterior a 64. Havia muita agitação estudantil naquela época secundarista. Eu me lembro de tomar porres homéricos na Confeitaria Atheneu, declamando e ouvindo os versos de Augusto dos Anjos. Era muito cedo para João Cabral de Melo Neto, que só vim a conhecer em 67. O movimento estudantil era bem organizado. Luciano era um dos líderes dessa militância política, antes e depois da ditadura militar. Ele seguia um caminho. Devia obediência ao Partido.
No final de 60, respondi a vários inquéritos policiais militares em Natal, na Fundação José Augusto, no quartel da Polícia Militar, no antigo 16º, e ainda fui intimado a comparecer à Auditoria Militar do IV Exército, em Recife. Fui absolvido. Nem por isso deixei de ser “comunista”. Para todos os efeitos, era comunista: não para os militantes clandestinos do PCBR, que me chamavam de “indisciplinado”. Era comunista para os “censores” que pontificavam nas redações, nos bares e nos lares. “Só pode ser comunista.” “Só os comunistas sabem fazem jornal”, eles diziam. Estava na cara que eu não tinha compromissos com esses ideólogos, a não ser o dever de trabalhar com dignidade para garantir o salário do jornalista. Alguns anos antes, tivera experiência semelhante no Banco do Brasil. O trabalho bancário, no cadastro dos pequenos trabalhadores, levou-me à Faculdade de Sociologia, em 68. Vinte anos depois, encerrei, sem diploma, minha vida acadêmica.
Havia alternativas para quem tinha uma “visão de mundo” marxista: lucidez ou alienação, revolução ou existencialismo pequeno-burguês, “ou ficar a pátria livre ou morrer pelo Brasil”. Para falar a verdade, andei viajando por este nosso “berço esplêndido”. Tanto que, em vez de um título acadêmico, ganhei o epíteto de “poeta marginal”. Bem feito, para quem andava por aí rodando cadernos de poesia em mimeógrafo. Era a ruptura, o começo do fim de todos os preconceitos, de uma angústia mórbida, de um Cristo vacilante, sem cruz ou apóstolos. O conceito de “pátria livre” continua em questão, no hino histórico e no cotidiano vulgar. Hoje sou apenas mais um poema inédito e isso, para mim, é evidência de que continuo na luta. A luta da palavra para encontrar seu meio de expressão. Não a vida literária, mas a luta da literatura.
Luciano de Almeida, operário intelectual, também está nessa luta. Lembra-me Engels, que antes dos 25 anos havia publicado o célebre “A situação da classe operária na Inglaterra”. O velho Marx, em “O Capital”, afirmou ter esse trabalho “uma profunda compreensão do modo de produção capitalista.” Os dois, Marx e Engels, cultivaram uma amizade de 40 anos. A respeito desse período, disse Engels: “Ao que Marx realizou, eu não teria chegado. Marx estava mais acima, via mais longe, abarcava mais e rapidamente, do que todos nós, os outros. Marx era um gênio, nós, os outros, no máximo, homens talentosos.”
Luciano de Almeida faz parte dessa luta. Enquanto existirem poetas, escritores, jornalistas, artistas da palavra, a própria arte terá sua recompensa. E a recompensa da arte é a maior compreensão do humano, suas idéias, seus questionamentos, a permanência do humano, sua força e sua ternura. A revolução é intemporal, porque está no coração dos seres. O mundo não pára de girar, com seus muros ruídos e seus ídolos de barro, todavia é preciso “comportar-se com seriedade diante de seus sonhos”, para citar uma máxima tão admirada por Lênin.

In A esquerda em Questão, do Socialismo Científico ao anarquismo
Luciano de Almeida. Coojornat, 1991.

por Alma do Beco | 2:17 PM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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